Há alguns dias eu chegava para conversar com um grupo de amigos quando fui chamado por dois deles para ser juiz de uma discussão histórica sobre aquilo que teria sido o "Caráter de Getúlio Vargas".
Sobre Vargas, até aquele momento da discussão, pesavam acusações de manipulador, maquiavélico, violento, autoritário e ditador.
Perguntado se Vargas - de fato - fora tudo isso, imediatamente concordei com os pejorativos morais que o qualificavam.
Meu amigo ainda disse: "Viram? Eu sempre disse que Vargas era um ditador; uma pessoa sem moral."
Porém, dessa vez precisei retificar minha opinião, explicando o que quase nenhum historiador faz: interpretar o personagem histórico dentro do seu próprio tempo histórico.
Por isso pedi que meus amigos primeiramente entendessem os motivos históricos que levaram Vargas a ter cometido atos que hoje julgamos incorretos.
Getúlio Dornelles Vargas nasceu em 1882, num Rio Grande do Sul agrário de homens rudes e sempre envolvidos em guerra e violência. Cresceu sob o espectro de ideologias fortes e conviveu com homens que faziam do Poder um mecanismo de opressão. Viveu numa sociedade que apenas conhecia a palavra Democracia, mas nunca a utilizara. Tanto é que "Democracia" era apenas uma palavra contida dentro das Constituições que estes mesmos homens do Poder as redigiam sozinhos, sem consultar a demos.
Vargas foi um personagem histórico forjado pela própria história da época. Tanto é que Vargas teve como contemporâneos outros tantos personagens de comportamento semelhante a ele: Hitler na Alemanha foi o exemplo de autoritarismo em nome do povo; Mussolini repetira tal atitude na Itália fascista concentrando "tutto nello stato"; Borges de Medeiros no Rio Grande do Sul manipulou eleições, reprimiu revoltas e se manteve por 25 anos no Poder; Flores da Cunha em Uruguaiana foi um déspota local; até na maior democracia do mundo - os EUA - Roosevelt governou por quatro mandatos, mostrando que naquela época o apreço pelo poder era algo comum e até justificável como moral em nome do Estado (Maquiavel, em O Príncipe, explica melhor).
E Getúlio Dornelles Vargas AO SER JULGADO PELOS SEUS ATOS DE ÉPOCA COM A VISÃO MORAL DE NOSSA ÉPOCA é vítima desse erro comum que muitas pessoas até hoje cometem: o pós-julgo fora do seu tempo.
Pois a moral depende muito da época.
Porém, independente da moral - que modifica-se conforme a época - o que eu constatei naquela discussão entre amigos é que a mania de sempre querer julgar e criticar as pessoas, fazendo uso de um pré ou pós-julgo, está presente em todas as épocas.
Sendo que na maioria das vezes, quem julga o outro nem moral tem para fazê-lo.
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