Hoje em dia qualquer pessoa
transparece ser inteligente, graças a internet e aos sites de busca. Um
trabalho de escola, ou de faculdade, pode ser facilmente elaborado com base em
pesquisas acessadas no Google ou Wikipédia. Um discurso pode ser preparado
usando textos prontos disponibilizados ao público na internet e redes
sociais. O “pseudo-intelectual” pode se tornar o centro das atenções num jantar
entre amigos com algumas poucas clicadas de mouse em sites de curiosidades.
A internet nos facilitou a vida, nos
proporcionou um caminho mais rápido à pesquisa e ao conhecimento, mas nos
tornou preguiçosos intelectualmente. Não precisamos mais ler; não necessitamos
mais sondar, inquirir por sabedoria. Na dúvida: clique!
Lembro, no meu tempo de Ensino Médio, a dificuldade que tinhamos quando os professores nos davam um tema para desenvolver.
Certa vez, metade da nota do trimestre dependia de uma pesquisa sobre “Quem
inventou a Imprensa?” Meus colegas e eu passamos dias nas bibliotecas à procura
do tema. Hoje, basta reescrever “quem inventou a imprensa” no Google e, numa
fração de segundo, somos inteligentes o suficiente pra saber que Gutenberg a
inventou na Alemanha, em 1450 e que sua primeira publicação foi uma bíblia.
Mas quando nem a internet
consegue responder – e o desespero bate – é que percebemos o quanto nos
tornamos dependentes cognitivos dessa ferramenta moderna.
Assim foi quando, em aula,
perguntei aos alunos algo que não existe na internet:
“Quem foi o uruguaianense que
morreu assassinado com um tiro, na saída da Catedral, num dia de eleição e hoje
é nome de rua?”
Uns, querendo aparentar
inteligência, acessavam seus celulares por baixo da classe, pesquisando, sem
achar nada. Outros, desesperados, saíam da aula e ligavam até pros pais, na esperança
de conseguir alguma resposta válida. Outros tantos, em ato extremo, arriscavam
na base de suposições falhas, valendo-se da dica: “nome de rua”.
"- Getulio Vargas, professor."
Exclamou um aluno, no fundo da aula.
Boa tentativa, meu jovem. Mas a
bala que matou Vargas foi disparada por ele próprio, no Palácio do Catete, no
Rio de Janeiro.
"- Não teria sido 'Sant’Ana',
professor?" Respondeu perguntando uma aluna timidamente curiosa.
Não, minha filha. Impossível
alguém assassinar a Santa Padroeira da nossa cidade, na saída de sua própria
Igreja.
"- Estou em dúvida, professor. Não sei se foi Duque de Caxias ou Santos Dumond." Disse, meio contrariado, mas com pose de intelectivo, o rapaz que queria impressionar a colega ao lado.
Em dúvida fiquei eu, sobre a sanidade mental daquele aluno, depois daquela diarréia frásica que ouvi.
"- Já sei! Foi o... '13 de Maio', eu moro lá!"
Vomitou, em forma de palavras, o confuso adolescente que chegara durante a aula e
quis arriscar na base do chute.
Claro. O ilustríssimo “Senhor 13 de
Maio”? Casado com a “Dona XV de Novembro”? Sendo que deste casamento nasceram os
jovens “7 de Setembro” e “14 de Julho”. Não, meu caro. Estas datas não são nomes de
pessoas.
"- Aaahhhh; eu sei professor! O Uruguaianense
que foi assassinado e hoje é nome de rua se chamava JOAQUIM MORTINHO!" Respondeu
com ênfase, aquele aluno, sem expressar nenhum sinal de ironia e sim de
convicção.
Foi então que dei por encerrada a
aula. Pois concluí que a internet, o Google, os sites de pesquisa e as redes
sociais, infelizmente, hoje já fazem parte enraizada de nossas vidas; e, adstritos
à esse fenômeno, todos nós recorremos – ou um dia recorreremos – à ela.
Prova disso é que, depois de hoje,
todos saberão, outros farão comentários, citações, apologias políticas, muitos fingirão
ser intelectuais em conversas, dizendo que Feliciano Ribeiro foi um
uruguaianense morto, na saída da Catedral, num dia de eleição.
Tudo isso porque eu, pra contar
esta história, disponibilizei esta curiosidade na internet.